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Matéria 7466, publicada em 06/11/2008.


:Luiza Martin

Charles discorda da visão estereotipada que as pessoas têm da cultura em Joinville

Bate-papo sobre cultura com o ex-presidente da FCJ, Charles Narloch

Equipe Revi


JOINVILLE E CULTURA: [1] - 2 - 3

Melatti: Um assunto que foi motivo de matéria aqui na Revi foi com o pessoal da área de teatro. Para eles, hoje na cidade o único teatro verdadeiro é o Galpão da Ajote. Isso porque lá tem uma estrutura para montagem, iluminação, etc, e isso chocou algumas pessoas que pensavam que o Teatro Juarez Machado é que era o grande teatro, o mais sofisticado da cidade. No entanto, lá não tem isso, né? Então, numa cidade desse porte, o único teatro, segundo os artistas, é um galpão caindo aos pedaços.

Charles:
Sabe por que que lá tem tudo isso? Em 2005, quando o Rodrigo (Bornholdt) entrou na prefeitura, a Ajote estava para ser dissolvida. Havia uma desilusão completa em relação às possibilidades de produção teatral em Joinville. O próprio Silvestre, que era o presidente na época, a Elaine, eu acho que era a presidente na época, eles estavam completamente desanimados. Aí foi uma decisão do Rodrigo na época. Ele disse assim: "O que que precisa? Precisa de uma estrutura mínima para o Galpão da Ajote que seja colocada à disposição da associação para que ela possa ter condições de realizar seus ensaios e fazer as apresentações com um mínimo de dignidade". Então, na época, foi uma opção. Se optou em investir em torno de R$ 60 mil para a aquisição dos equipamentos, do novo tablado, das cadeiras e cortinas, enfim. Então, foi um investimento da prefeitura, os equipamentos são da Fundação Cultural, porém, cedidos pela prefeitura para associação para que ela tivesse condições de fazer aquele trabalho que é maravilhoso. Todos sabem que foi naquele momento que mudou completamente a cena do teatro, até então. Não é só aquilo. Junto com aquilo surgiu o Simdec. Então, a Ajote recebeu os equipamentos mínimos e surgiu o Simdec, que é o Sistema Municipal de Desenvolvimento pela Cultura que oferece recursos. E aí, neste último ano, a gente chegou a 100% de captação graças a várias empresas, principalmente a Datasul que optou por apoiar praticamente tudo, né. A gente chegou em três anos a 100% de captação. Isso mudou completamente a realidade. Agora, o Teatro Juarez Machado, para começo de conversa, não foi projetado como um teatro. Ali era um depósito, o fosso do palco principal. Foi uma adaptação, eu não estava aqui na época. Uma adaptação possível para utilizar aquele espaço como se fosse um teatro. Mas, enfim, lá (Galpão da Ajote) tem condições, tem 60 varas que sobem, o cenário pode ir para os lados, então, tem uma série de possibilidades que o Teatro Juarez Machado não tem. E mais: o Teatro Juarez Machado não tem a estrutura mínima de luz e som. Um dos projetos aprovados na Lei Rouanet agora é justamente esse, de aquisição de equipamentos de luz e som. A questão de investir lá na Ajote foi estratégica. Investimos lá porque o Rodrigo achou, eu concordei com ele, que o efeito multiplicador ali, na base, seria mais forte do que investir no Teatro (Juarez Machado), que precisava de um montante muito maior para resolver os problemas né, e que tem uma pauta que disputa com eventos comerciais. Então, foi uma questão estratégica, de apoiar diretamente onde ocorre a produção de teatro, que é o Galpão.

Ariane: Sempre ouço falar que Joinville é uma cidade não muito desenvolvida culturalmente. A Fundação Cultural chegou a estudar isso? De saber por que isso acontece aqui?

Charles: Eu discordo dessa posição, em partes. Tudo depende de como você interpreta o conceito de cultura. A maioria da pessoas que se refere ao fato de Joinville não ser muito desenvolvida culturalmente pensa primeiro em artes, e em segundo lugar, geralmente, em eventos. As pessoas dizem que Joinville não tem cultura porque não vem um evento do Jota Quest para cá, porque não vem uma grande dupla sertaneja, porque não vem a cantora de axé da Bahia. Isso não é, necessariamente, atuação do poder público, isso é mercado, é resposta a um mercado. Se houver mercado para shows comerciais, culturais, vai haver uma resposta por parte dos produtores e esses shows vão acontecer naturalmente. A gente precisa pensar primeiro o que é cultura. Se a gente for levar em consideração o conceito sociológico e antropológico, Joinville tem sim muita coisa. Agora você precisa considerar que aquela atuação lá no bairro, aquele coral, o grupo de terno de reis, o grupo de boi-de-mamão, o grupo de um folguedo popular, germânico ou não, tudo isso faz parte da cultura. É que geralmente a gente imagina uma atuação cultural pautada só em eventos, e essa não é a função principal. Aliás, essa é a função menos importante do poder público.

Tuane: As pessoas reclamam muito da falta de divulgação da cultura em Joinville. Como funciona isso?

Charles: Talvez a divulgação mais forte seja a mais difícil que é a mídia paga, porque tu precisas ter muito dinheiro para realizar um evento. E, muitas vezes, a mídia é a parte mais cara. A maioria dos projetos propostos, não só do poder público, como dos produtores culturais, reservam uma pequena parte para a divulgação através da mídia paga. Até porque as leis de incentivo federal, estadual, a municipal nem permitem (maior destinação), porque senão o dinheiro público investido nesses projetos iria, principalmente, para a divulgação. E não é o caso, ele é, principalmente, para a organização. Nem sempre há parcerias dos meios de comunicação no sentido de apoiar institucionalmente. Muitas vezes esperam, porque são empresas. E é natural que haja o investimento de quem está organizando. A Fundação (Cultural de Joinville) tem, assim como o Sesc tem, os seus sites, o seu mailing – que é um mailing até grande –, tem uma agenda que é entregue para os jornais que vai toda semana, tem um agendão que é impresso, que tem todos os dias do mês, que está nos bares e nos restaurantes. Creio que seja também uma dificuldade cultural, assim, de comportamento das pessoas. A gente se propôs, quando eu estava na Fundação, a fazer uma agenda geral, não só das ações da Fundação, porque a Fundação é muito mais abrangente do que ela própria. Tem muita coisa acontecendo na cidade, até apoiado pela própria Fundação através do Simdec. Só que é muito difícil ter uma resposta das pessoas: geralmente os eventos são organizados em cima da hora. Com dez dias, com quinze dias de antecedência. E você não consegue organizar uma agenda mensal, se você não tiver um planejamento de no mínimo trinta dias, às vezes quarenta dias. Tem que ter uma organização mínima, de trinta dias. E, muitas vezes, não há esse cuidado e essa possibilidade de organizar com tanto tempo de antecedência. Mas, falta muita coisa.

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