Envolto em várias perguntas sobre a sua posição particular e a do jornal Le Monde Diplomatique Brasil sobre a exigência do diploma para o exercício do jornalismo, o sociólogo e editor-chefe do carinhosamente apelidado Diplô Sílvio Caccia Bava debateu com professores e estudantes do Ielusc. Nos poucos momentos em que a discussão mudava de foco, ele pôde falar sobre as ambições e os objetivos da versão brasileira do periódico francês. Também foram discutidas as posturas políticas no jornalismo, a democracia na sociedade e na mídia e as perspectivas para o jornalismo diário. A palestra foi uma das atrações do segundo dia da Semana Acadêmica da Comunicação Social e aconteceu na noite de quarta-feira (21 de outubro), no Salão da Comunidade do Ielusc.
Caccia Bava é graduado em Ciências Sociais, mestre em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e descobriu a política através dos movimentos estudantis. Em 1987, em conjunto com outros colaboradores, fundou o Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais – Pólis, cujos significados em grego remetem não só a cidade e cidadania, mas a democracia e participação, lemas adotados pela instituição que mantém a produção da edição impressa do Le Monde Diplomatique no Brasil.
A publicação do jornal pelo instituto Pólis tem relação de concessão com o Le Monde francês, que exige a veiculação de 60% do conteúdo produzido na França, de acordo com as características e interesses do cenário nacional. Os outros 40% do conteúdo do Diplô são de responsabilidade dos colaboradores brasileiros. Normalmente, os textos nacionais são escritos por especialistas de diversas áreas a partir das necessidades de cada tema, enquanto os textos franceses são produzidos por jornalistas e traduzidos. Entre os colaboradores brasileiros estão sociólogos, cientistas, arquitetos, artistas, pesquisadores e até jornalistas que recebem pagamento pelos textos produzidos de forma simbólica, sem remuneração regular.
O Diplô, explica Caccia Bava, tem o objetivo de ser um jornal diferenciado, que tenta levar informações com diferentes pontos de vista para a sociedade. “Os principais meios de comunicação lutam só pelos seus interesses, não pelo público”, afirma o editor. Com isso, o jornal assume sua posição de esquerda e de defesa pelas lutas sociais. Reafirmando a posição política do jornal, o sociólogo dá como exemplo uma matéria feita com um jurista assumidamente “tucano” que foi complementada com a participação de um jurista de esquerda. Quando questionado se Diplô teria a mesma atitude se o primeiro entrevistado fosse de esquerda, a resposta foi simples: “não”.
O público do Diplomatique tem um perfil bem delineado: a maior parte é composta por pessoas com pós-graduação e estudantes. Com esses leitores a área de abrangência do jornal fica limitada, mas aposta na capacidade de multiplicação desses agentes. Outro nicho atendido são os cursos pré-vestibulares, visto que suas matérias e artigos tratam da contemporaneidade no país e chegaram mesmo a ser utilizados como texto-base em questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Nessa mesma linha, o instituto Pólis ajuda alguns movimentos sociais com a doação dos exemplares do jornal que retornam das bancas.
Segundo Caccia Bava, a presença do Le Monde Diplomatique no mercado brasileiro ainda é tida como ignorada pelos grandes veículos jornalísticos, embora de 2008 para 2009 ele tenha sido o único jornal a crescer no país. Com o expressivo número de 38% de aumento nas vendas, ele já ocupa 8 mil bancas com tiragem de 40 mil exemplares mensais.
No debate paralelo ao tema trazido por Caccia Bava, a exigência do diploma de jornalismo fez alguns participantes levantarem questionamentos sobre o formato do Diplô – que tem somente um jornalista trabalhando na edição dos textos. O sociólogo acredita que o jornalismo tem a função, além de informar, de questionar a realidade, e gostaria que esse fosse um trabalho de qualidade, crítico e humanista, diferente daquele que produz a maioria das notícias que circulam nos principais jornais do país. “O jornalismo faz uma leitura da sociedade”, complementa, levantando a questão de como as informações podem defender certos interesses. Outro ponto defendido por Caccia Bava é a possibilidade que o mercado tem de gerar um exército de reservas com a obrigatoriedade do diploma.