Inicio as considerações louvando a iniciativa de todos que comentaram a matéria “Biblioteca do Bom Jesus Ielusc é furtada”, de Ariane Pereira, publicada pela Revi no dia 7 de maio. Essas pessoas sim suscitaram o debate. Inauguro um novo espaço por esse arremedo de texto para facilitar a leitura dos parceiros que navegam na Revi, e que, como eu, espremeram seus olhos nos últimos cinco dias para acompanhar, com atenção, na letras corpo 0,5 dos comentários da Revi, os desdobramentos daquele que já é chamado pelos corredores de “caso Ariane”.
Tomo esse nome espontâneo, “caso Ariane”, como apropriado por não ser inédito. Já vimos, nos últimos anos, o “caso Ronaldo” (cobertura da monografia de Joyce Reinert) e o “caso dos quadrinhos” (cobertura da monografia de Josane Muriel), para lembrar dos “casos” mais recentes.
Considero a Revi um espaço lindo de aprendizado e discussão de idéias. Mas para ser lindo precisa funcionar corretamente. Não posso falar da monografia de Joyce Reinert, pois confesso não ter lido uma linha sobre isso na Revi por pura falta de interesse. Mas relembro agora a situação dos quadrinhos e a discussão sobre a espetacularização das defesas de monografia, ocorrida quando eu ainda era um dos seis repórteres da Revi, e a faço dialogar com a presente discussão de ocultação de fontes e conduta ética que fizeram todos, desesperadamente, procurar pelo WC no Ielusc, e pedir que ele devolva os livros que, segundo a matéria da Ariane, roubou.
Acredito que ambos os casos decorreram de falhas operacionais e editoriais da Agência Experimental. Na época da monografia de Josane, a Revi estava saturada de coberturas de monografias que eram todas iguais, cronológicas e herméticas. Lembro que, quando começou a feitura dos quadrinhos na redação, todos ficaram, justificadamente, eufóricos com a possibilidade de fazer algo diferente num ambiente que inegavelmente abre espaço para aflorarem as criatividades individuais. Porém, quando vieram as críticas alguns se abateram, outros rebateram, mas todo mundo ficou meio estarrecido com a proporção que o assunto tomara.
O paralelo com a situação atual parte daí: não acho, sinceramente, que a Ariane ou algum dos coordenadores acreditasse, desde o início, que a matéria seria assim tão estrondosa, e que abriria espaço para a maior discussão que a Revi já viu, em termos de comentários. Digo isso porque o sentimento, entre todos os mais de uma dúzia de bolsistas que conheço ou com os quais trabalhei, é o de que o taco da Revi não é tão confiável. Em outras palavras, a Revi não leva fé em si mesma, no seu alcance e no que representa para a comunidade acadêmica.
Esse problema de auto-estima generalizado proporciona um problema um pouco maior, que toma proporções gigantescas quando chega às raias do debate público: há falta de cuidado no processo. Justifico: quem lê a matéria da Ariane pode notar três características facilmente:
1.a matéria não estava pronta para ser publicada: faltam fontes (a instituição é citada e não é ouvida, e falta um contraponto para o psiquiatra, por exemplo). E essa falta de substância não pode ser creditada a Ariane, já que a Revi é uma Agência Experimental, e por princípio, não admite nenhum bolsista que saiba tudo de Jornalismo, até porque alguém assim não precisa de faculdade. Ela tem o direito de ter dúvidas, e os coordenadores têm o dever de, dentro do possível, dirimi-las, usando para isso seu conhecimento acadêmico e sua experiência profissional. Ponto negativo para a coordenação da Revi, que largou na grande rede uma matéria que, além de vazia, não acertou no título (que sugere um novo furto, coisa que não aparece no texto).
2.Faltou orientação: Ariane conhece WC, e sua atitude de manter o nome do colega em sigilo é louvável, em se tratando de relações de amizade. O dedodurismo é uma das maiores pragas de personalidade. Porém, no momento em que o nome e a foto dela apareceram estampados na Revi ela assumiu um compromisso de fazer parte de um dos (poucos) veículos de comunicação mantidos pela comunidade acadêmica. E esse compromisso é ético, com a informação, e público, com a comunidade acadêmica. Qualquer um, calouros de Redação 1 ou profissionais com 50 anos de tarimba, balançaria diante dessa situação. E é a própria Revi que deveria ter resolvido esse problema, no próprio laboratório 4, para que a matéria tivesse saído redondinha, talvez sem WC, e talvez com o nome de outro repórter no lugar do da Ariane.
3.Faltou comunicação: o relato dos coordenadores dá conta que Sílvio Melatti havia pedido mais tempo de apuração para Ariane, e a instado a correr atrás de novos pontos de vista, além de mais uma apertada em WC. Porém, a matéria acabou, na mesma tarde, sendo aprovada por Izani Mustafá. Tal fenômeno não é admissível, pois os bolsistas ficam sem referência, e o público, com informações pela metade. A condenação não recai sobre Izani, mas sim sobre o processo de produção de conteúdo da Revi, que muitas vezes violenta o sentido da informação bruta.
Minha crítica é direta à maneira como a Revi se organiza. Muitas vezes a frouxidão impera a título de não-cerceamento. Acredito que faltou pulso e convencimento para dizer a Ariane que ainda não era hora de colocar sua matéria na roda. Faltou esclarecer para ela mesma que a dúvida que deve ter surgido não era exclusiva dela, e sim de qualquer jornalista que se propõe a exercer sua função de maneira séria. Faltou pensar nas conseqüências, que não geraram apenas a discussão sadia de idéias, e sim também as exposição pública de Ariane, que ainda não é (como nenhum de nós, acadêmicos) uma jornalista pronta para agüentar um tranco como esse.
Minha sugestão, que repito desde a época em que era bolsista, é a instituição do ombudsman da Revi. Claro que esbarramos aí no problema administrativo-financeiro, que dificulta a remuneração de mais uma pessoa (bolsista ou professor) para gastar suas horas observando a Revi e apontando seus erros e acertos, seja de dentro ou de fora do processo. Porém, seria muito bem-vindo um trabalho voluntário da parte da comunidade acadêmica para a criação de um observatório de imprensa acadêmica, que discutiria coberturas como a do furto do WC, ou dos quadrinhos monográficos, ou mesmo as mesas-redondas de quartas-feiras, na cantina, e até a revista científica Rastros. Claro que nada disso adianta se não houver um tratamento mais apurado da informação e seu contexto dentro da Revi, por coordenadores e bolsistas, para que um problema como esse da Ariane não ocorra novamente, e que os debates que surjam não sejam sobre WC, gente que não merece os nossos apertões de teclado. Atenção, seriedade e comunicação eficiente dentro da redação, essa é a minha sugestão de receita.
* Jouber Castro é ex-bolsista da Revi e acadêmico do 5º período de Jornalismo