O banquinho da linotipo já não era ocupado há mais de dois meses. Sem
Nelinho, a máquina ficou fadada à própria sorte. Nas mãos do antigo dono, fervia
a 370 graus celsius. Agora, permanecia gélida. Carmelita da Silva, a viúva,
pouco pôde fazer. Ela nem mesmo sabia ligá-la. E nem pretendia. A esposa queria
ver a herança do marido onde ele tanto desejou: em meio aos futuros jornalistas.
Mas, no Ielusc, os responsáveis pela instituição não pareciam compartilhar do
mesmo interesse. O preciosismo da diretoria impedia a realização do sonho.
Alegavam falta de espaço – e já sobravam salas vazias na época. Para Carmelita,
que não conseguia mais encarar a peça, só restou uma saída: vender a antiga
fonte de renda da família.
Os compradores apareceram. Notaram o ótimo estado da mercadoria, mas pouco se
importaram. Não se interessavam pelo funcionamento do produto, só queriam
sucateá-la. E, assim, três homens sovaram a máquina a marteladas. Foi
preciso cortá-la em pedaços para atravessar a porta. Lágrimas desesperadas
corriam pelo rosto de Dona Carmelita, que tapava os ouvidos em vão. O barulho
das pancadas por muito tempo ainda ecoaria na memória da viúva. "Foi muito
triste, não gosto de lembrar".
Carmelita não consegue imaginar a reação do marido, caso houvesse
testemunhado o fim trágico da linotipo. "Sempre que ela dava algum problema, ele
mesmo consertava. Aquilo era a vida dele", lamenta. O valor pago pela sucata,
lembra a viúva, foi "mais ou menos 800 reais".