É em uma subdivisão da sala 111 do bloco F, de aproximadamente 4 por 6
metros, que cerca de 17 acadêmicos de Ciências da Computação da Udesc se reúnem
todos os dias. Entre móveis velhos doados por professores, computadores doados
por instituições de ensino e uma cafeteira adquirida por eles mesmos, os jovens,
todos na faixa de 20 anos, cooperam para o alcance de um ideal: a busca da
liberdade no mundo digital.
Colméia é um grupo de pesquisa que
integra professores e alunos do Centro de Ciências Tecnológicas da Udesc e
utiliza, pesquisa e desenvolve sistemas computacionais em software
livre. O núcleo nasceu no final de 2002. Quando Marco Carvalho de Oliveira, que
está há mais tempo no Colméia, entrou para o grupo em 2006, havia apenas dois
computadores. Até o ano passado, Dino Raffael Cristofoleti Magri completava a
dupla de bolsistas. Hoje são oficialmente quatro, mais outros que ganham bolsa
dos parceiros de projetos e alguns voluntários. “Eu não sabia nada de Linux
quando entrei. O Marco foi quem me ensinou”, conta Dino. O estudante de 20 anos
está no segundo ano de faculdade e é o estagiário que ficará no Ielusc nas
terças e quintas-feiras pela manhã e nas sextas-feiras à tarde para dar
assistência aos usuários do novo sistema operacional instalado nos computadores
do campus.
“O carro-chefe do Linux é poder adaptá-lo de acordo com suas necessidades e
sem gastar nada”, afirma Dino. O software livre é mais do que uma
alternativa. Para o Colméia, é uma filosofia. O GNU/Linux oferece quatro
liberdades ao usuário: executar, alterar, copiar e distribuir. Das várias
distribuições, a que mais popularizou o Linux foi a Ubuntu. A cada seis meses
uma nova versão é disponibilizada. A que foi instalada no Ielusc é a 8.04,
lançada em abril de 2008. A próxima atualização será em outubro, portanto, a
8.10. Grandes corporações são adeptas dos programas de código aberto. Algumas
delas: IBM, Yahoo, Intel, Google, Globo.com, Correios, Banco do Brasil, Caixa
Econômica Federal e Nasa.
A instituição privada de ensino pioneira no uso do open source em
Joinville é o Ielusc. Jean Rafael Schulz, analista de sistema e administrador de
redes do Secord, conheceu alguns membros do Colméia no Flisol (Festival
Latino-americano de Instalação de Software Livre) deste ano. O evento acontece
em várias cidades da América Latina simultaneamente. Em Joinville foi organizado
pelo Grupo de Usuários Linux de Joinville, o Guxlle, que promove discussões e
encontros “presenciais” para troca de experiências e instalação do sistema
operacional nas máquinas de quem estiver interessado. Como o Ielusc estava nessa
fase de migração, Jean procurou Marco, do Colméia, para disseminar o
software livre no campus. Dino se interessou pelo projeto e se propôs
a ajudar em cursos para os funcionários, desenvolver scripts de
configuração e configurar as máquinas. Devido à burocracia, o Colméia não pôde
ajudar naquele momento, então o Secord assumiu toda a responsabilidade. “A
faculdade vai estar à frente das outras, pois os estudantes vão conhecer
programas diferentes, o que abre o leque de conhecimento em softwares,
fato importante no mercado atual em que cada vez mais grandes empresas adotam os
softwares livres”, enaltece Dino. Hoje, 113 computadores do campus têm
Linux e 75% funcionam no modo dual boot (com dois sistemas
operacionais).
Outros projetos
Após um ano e meio no Colméia, Dino propôs a criação de um livro-consulta, em
que reuniria explicações sobre o grupo e o mundo GNU/Linux. Então, com o apoio
dos integrantes, foi elaborado o Colméia GNU/Linux Book. O projeto está em
andamento e conta com a ajuda da maioria dos participantes. Todos os artigos e
tutoriais escritos pelos membros também estão reunidos no blogue do grupo. Os registros
servem para que o conhecimento gerado lá dentro não se perca com o tempo e seja
repassado para os novos integrantes e quem mais desejar acessar as informações.
Dentre os projetos, o Remasterização da Distribuição Edubuntu se destaca. Tem
como objetivo modelar o sistema dos computadores escolares para conter todos os
pacotes requisitados pelos professores da rede municipal de ensino. O Colméia
atingiu quase 13 mil alunos em 48 salas no ano 2007, segundo a Secretaria de
Educação. Até este mês, o Edubuntu deve ter chegado a 15 mil alunos. Cerca de
50% dos computadores da rede municipal têm o sistema operacional Linux.
Acoplado ao Edubuntu, desenvolveu-se outro projeto: o Multi-Terminal.
Consiste na utilização de um único gabinete para conectar quatro monitores,
teclados e mouses. Essa tecnologia possibilita que a capacidade do computador
seja usada por inteiro, economizando 60% com gastos na compra de equipamentos. O
projeto é baseado nos estudos e tecnologias desenvolvidas pela UFPR/UFRJ com
base no trabalho de um estudante que precisava dividir o computador com a
namorada.
“As crianças chegavam em casa pedindo aos pais para colocarem o Tux nos
computadores”, conta o bolsista Alan Rafael Fachini. Tux é o pingüim mascote do
Linux e personagem de alguns jogos educativos instalados nos PCs das escolas.
Várias cópias do software livre foram distribuídas aos pais a pedido
dos alunos. As crianças, por estarem começando a mexer com informática, não
estranham e se acostumam rapidamente a usar o Linux, que é até mais fácil em
alguns aspectos. O preconceito que há vem de alguns dos professores. “É um
problema cultural. Depois de anos acostumadas a apertar sempre o mesmo botão no
mesmo lugar, algumas pessoas têm dificuldade para assimilar o novo”, explica
Alan.
O estudante é um dos envolvidos em outra
proposta – o projeto Piá. O objetivo é fazer a conversão de máquinas
caça-níqueis apreendidas em todo o estado e que antes eram destruídas. Os
computadores têm boa configuração e custam de 1.500 a 2 mil reais. A
responsabilidade do Colméia é manter o sistema GNU/Linux rodando nas
máquinas e fornecer treinamento técnico para os responsáveis pela manutenção. O
custo fica em torno de 100 a 150 reais para comprar mouse, teclado e pintar a
caixa. Um estagiário do curso de Design da Univille e um grafiteiro do bairro
Paranaguamirim são os encarregados de deixarem a máquina esteticamente bonita.
Joinville tem cerca de 2 mil caça-níqueis apreendidos, porém não há ainda na
cidade nenhum computador do projeto Piá. A Univali e a UFSC são pioneiras do
projeto em Santa Catarina. A iniciativa foi do Ministério Público e o Colméia
tem o apoio da Casa Brasil e do comitê Fome Zero.