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Matéria 6286, publicada em 03/06/2008.


:Djulia Justen

Karam analisa os temas éticos a partir da rotina jornalística

O jornalismo precisa de uma ética própria, diz Karam

Gustavo Cidral


“Não existe uma ética específica do jornalista: sua ética é a mesma do cidadão”. A afirmação do jornalista Cláudio Abramo, em "A regra do jogo", vem sendo usada por profissionais para escapar de uma discussão a respeito do compromisso social e da responsabilidade perante o público. Em “Jornalismo, ética e liberdade”, o pós-doutor pela Universidade Nacional de Quilmes/Argentina (UNQ) e professor da UFSC, Francisco José Karam considera insuficiente a reflexão de Abramo, apesar de reconhecer a importância da pesquisa. O autor defende uma “ética universal específica para o jornalista, com traços operativos distintos das demais profissões”. Demonstra que “a ética jornalística não se reduz à normatização escrita, mas faz parte do processo interior do profissional, que deve se refletir no trabalho cotidiano e se relacionar à totalidade social”.

Karam compara o jornalista e o médico. As duas competências profissionais distintas revelam que o jornalista seria o único capaz de mediar um acontecimento, o que lhe dá o direito de saber mais do que a população sobre algum fato, podendo até manipular a informação, assim como o médico é habilitado para abrir um corpo e mexer num órgão. A ética social é o que aproxima o médico do jornalista, mas cada trabalho tem sua particularidade. Por isso, Karam garante que “é indispensável constituir o campo da ética jornalística”.

A lógica da teoria de Abramo sugere que qualquer profissional, seja médico, engenheiro, advogado, teria um compromisso tão grande com a linguagem jornalística, coleta e edição de material quanto o jornalista profissional. “Para perceber a dimensão ética da atividade jornalística é preciso situá-la em sua importância ontológica e epistemológica para toda a humanidade”, diz Karam. As respostas estão intimamente relacionadas à concepção do que é jornalismo e para que serve. O autor provoca a indagação sobre os problemas detectáveis na profissão em sua apropriação da realidade.

Hoje em dia é comum o jornalista ter que escrever uma boa matéria com talento e precisão, trabalhando em três lugares diferentes, ganhando mal, indo à rua com quatro pautas e com tempo delimitado. O profissional se submete a cortes de edição sucessivos ou perde o emprego. Tem que conciliar uma profunda reflexão sobre a profissão vivendo num ritmo avassalador de levantamento diário das informações. Usar os métodos lícitos para obter informações de fontes que podem utilizar os ilícitos para escondê-las.

No debate sobre o uso do off, realizado em 19 de maio no anfiteatro do Ielusc, o professor de redação e integrante da bancada Jacques Mick contrariou Abramo e relacionou a distância do moralismo para o humanismo que o jornalismo constitui. Em um parágrafo inteiro, Karam perpetua a idéia: “Por isso, o jornalismo não pode deixar de ser crítico, de traduzir a diversidade e conflitos. Isso só seria possível se escondêssemos a humanidade de si mesma e a cotidianidade de todos nós. É o que tentam fazer o jornalismo liberal submetido à lógica do mercado, as censuras, autocensuras e o caminho moral pelo qual vai adentrando Janet Malcom em sua condenação genérica do jornalismo. Este caminho também subsidia teorias sobre o jornalismo que amparam uma ética socialmente particularista”.

Dentro da discussão sobre a ética, Karam aborda os métodos usados na obtenção da informação. Para investigar um caso, jornalistas chegam a se apresentar como profissionais de outras áreas, obtêm gravações e fotografias clandestinas ou alteram a identidade. Tais esquemas são a única maneria de investigar muitos aspectos relevantes e de interesse social. A sociedade exige do jornalismo a pluralidade de versões e a maior transparência possível da realidade. A informação jornalística, diz Karam, “para ser exata, imparcial e ter responsabilidade social, precisa ir além das poucas declarações ou documentos parciais, no sentido de revelar publicamente aquilo que atinge o público em sua cotidianidade.” A responsabilidade do jornalista com a informação e com a mediação da realidade é maior do que a da fonte ou de um cidadão que não está diretamente ligado ao universo cotidiano do jornalismo. O jornalista pode ir da posição de invasor de privacidade ao de profissional de extraordinárias qualidades, obtendo o reconhecimento social pelo papel que teve ao fazer uma denúncia através de gravações de telefonemas, fotografias de uma articulação clandestina, etc. Em alguns casos, métodos ilícitos acabam sendo considerados lícitos.

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