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Matéria 4347, publicada em 21/05/2007.


Unificação da língua portuguesa

Clayton Felipe


As duas grafias da língua portuguesa estão prestes a serem unidas. E para isso acontecer basta que Portugal e Cabo Verde assinem o acordo de unificação, aprovado em 1990 pela Comissão dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e que até hoje não saiu do papel. Agora, em 2007, a possibilidade de ratificação do protocolo (acordo) é concreta. O Brasil já enviou o documento a Portugal e a Cabo Verde. A assinatura dos dois é suficiente para que a grafia única seja adotada.

O principal argumento a favor da unificação é o fortalecimento do português, o terceiro idioma ocidental mais falado no mundo. Duzentos e trinta milhões de pessoas espalhadas nos oito países — Brasil, Portugal, Cabo Verde, Angola, Guiné Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste — falam a língua. As duas grafias oficiais são a brasileira e a portuguesa. Outros idiomas ocidentais passaram pelo mesmo processo: alemão, espanhol e italiano.

“A mudança vai causar bastante confusão, pois a gramática é complicada e as pessoas não conseguem ou têm dificuldade para escrever de acordo com a norma culta”, diz o professor Alencar Schueroff, um dos mais conhecidos de Joinville. Apesar de a comunidade docente saber da mudança, há poucas conversas sobre o assunto. “Estamos esperando definições”, conta. E conclui: “Vai ser interessante”.

O professor de redação jornalística do Ielusc Jacques Mick esclarece que é um assunto debatido, embora em círculos muito restritos. "O tema reaparece, de tempos em tempos, desde o início dos anos 1990, quando a unificação começou a ser levada a sério, a partir do acordo. Evidentemente, trata-se dessas abordagens tipicamente midiática - o assunto é apresentado e logo esquecido", e acrescenta: "Tampouco há, ao que sei, políticas públicas para estimular a discussão e preparar a implantação das mudanças”.

A grande imprensa, segundo Mick, também terá que se adequar as normas. “Os manuais terão de normalizar as opções de cada veículo. Há jornais, como a Folha de S. Paulo, que já incorporaram algumas decisões derivadas da unificação, como a extinção do trema. Haverá um período em que o número de erros de ortografia será maior, depois tendera à média”, prevê.

História da unificação

O filólogo Antônio Houaiss foi um dos mais interessados na unificação. A maior resistência vem de Portugal. Por um motivo perfeitamente compreensível: eles eram a matriz, o Brasil era a colônia. A unificação privilegia a grafia brasileira.

Os portugueses também se consideram os guardiões da língua. Argumentam que a unificação fará a mesma coisa que se fez com o latim: acabará por empobrecê-lo. Havia o baixo-latim e latim culto. A linguagem falada pelo povo prevaleceu o e latim culto se exauriu.

Fazia-se uma crítica ao filólogo de que ele defendia a unificação para não ter que lançar duas edições do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. E realmente ele esperou um bom tempo pela unificação – seria muito mais viável e econômico. Mas os motivos principais eram outros. Os argumentos favoráveis são muito mais fortes e deixam claro que se fortalecerá o idioma.

A publicação do maior e mais completo dicionário da língua portuguesa só ocorreu em 2001 – quinze anos depois do início do projeto e dois anos depois da morte de Houaiss, que não viu a unificação das grafias, mas deixou seu legado como o grande estudioso do idioma dos últimos tempos.

Principais alterações

Ao todo, 40 mudanças estão previstas na unificação ortográfica da língua portuguesa. Elas se referem ao uso do hífen, à acentuação, e à pronúncia, além de alterações no alfabeto. Pior para os portugueses, pois a maioria das mudanças exige adequação deles à grafia brasileira. As letras sem sonoridade serão retiradas da maioria das palavras. Por exemplo, “herva” e “húmido” passarão a ser grafados da mesma forma que nas terras tropicais: “erva” e “úmido”.

Abaixo do equador vai ser difícil se acostumar com a abolição de alguns acentos. “Crêem”, “lêem” são alguns casos de sumiço de acento. Logo diremos que eles/elas “creem” e “leem”. E o “enjôo” será um mero “enjoo”.

Outras serão imperceptíveis, como a incorporação das letras “k”, “w” e “y” ao alfabeto. E o pobre trema, já pouco usado, será menos ainda – salvo o caso de nomes próprios e suas derivações.

Contudo, há várias concessões. Um exemplo é o uso do acento nas palavras como “acadêmico” e “bônus” que em Portugal são grafadas com acento agudo, “académico” e “bónus”.

Prós e contras 

Com a padronização, será facilitada a circulação de livros - científicos, literários, mas principalmente didáticos - entre os oito países de língua portuguesa. Gastar-se-á menos dinheiro com a publicação de edições diferentes. Bastará apenas uma edição para lançar um livro aqui e acolá. Não é preciso explicar o quanto isso agrada as editoras.

As duas grafias oficiais impedem que o idioma seja uma das línguas oficiais da Organização das Nações Unidas (ONU). Esse problema estaria resolvido com a reforma. O possível aumento da circulação de livros didáticos e publicações científicas é um dos principais argumentos a favor da unificação.

O argumento contrário é feito principalmente pelos portugueses. Eles acusam os “inovadores lexicográficos” de empobrecer o idioma. Tirando parte da sua erudição.

Caetano Veloso escreveu a canção Língua que trata sobre algumas questões pertinentes a essa discussão.

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