Ontem, dia 7 de novembro, “a maior cidade do Estado” teve um dia agitado, como sempre. O Ministério da Saúde confirmou o envio de mais de meio milhão de reais para a construção de importantes obras, foi decidido o dia de inauguração da sede da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) e a prefeitura teve um projeto sobre parcerias público-privadas barrado pelo legislativo. Executivos desembarcaram com pressa no aeroporto a fim de fazer negócios na “maior cidade do Estado”, cotações das empresas com sede na “maior cidade do Estado” oscilaram como nunca na bolsa de valores, a polícia da “maior cidade do Estado” teve muito trabalho ao longo do dia. Enfim, foram 24 horas alucinantes. Tão alucinantes a ponto da manchete do principal jornal da “maior cidade do Estado” tratar da presença de uma ave numa árvore. A fonte tamanho 72, em negrito, não deixava dúvidas: “Coruja muda rotina em escola”.
Se a matéria tivesse contornos literários e figurasse na New Yorker, ou na edição dominical do Le Monde, vá lá, mas lead e sublead para falar de uma coruja? O mais divertido é ler as declarações das fontes – um tom sério para algo que seria brilhante se estivesse no caderno de cultura de qualquer jornal. Não vou me dar ao trabalho de descobrir o que levou uma equipe inteira a escolher tal matéria como a mais importante do dia – até porque trabalhei com boa parte deles e os respeito muito. O fato, na verdade, é gancho para tratar de outra coisa. Quem leu “Em São Paulo, não se pode olhar apenas as aparências”, de Jouber Castro, desta Revi, notou como os olhos de um joinvilense se comportam diante de um município maior do que a “maior cidade do Estado”.
Joinville é, para todos os efeitos, uma cidade do interior (afinal, não é capital). Aliás, vale dizer que ela fica num Estado periférico (oras, Santa Catarina não tem Amazônia, Bovespa, Rede Globo ou ACM). A propósito, cabe a digressão: um arguto comentarista disse ontem no periódico da matéria da coruja que “pelas rodas mais sofisticadas, os vestidos curtos vão bem com as sandálias anabela”. E foi além, ditando moda: “Antene-se”. Não há necessidade de esbanjar erudição e promover longas e profundas análises sobre o modus operandi da imprensa da região ou o status quo local. Melhor deixar isso para os alunos da pós-graduação. Quero apenas estimular os olhos do leitor, assim como os de Jouber foram quando esteve aqui (moro há um mês em São Paulo, depois de passar um ano em Brasília).
A proposta é simples. Visite Florianópolis. De ônibus, de carro, de carona, de excursão, sozinho, com amigos. Veja o quanto a região metropolitana da capital é muito maior, mais movimentada, mais agitada, mais... tudo do que Joinville. O primeiro impacto vai ser imediato: você jamais voltará a escrever “a maior cidade do Estado”, por razões óbvias, dessas que saltam aos olhos. O segundo é que você deixará de escrever com tanto deslumbramento como o Jouber fez (melhor deixar a Síndrome de Stendhal para Paris e Nova Iorque). O terceiro, e mais importante, é que quando você estiver nas redações e assessorias, vai lembrar de tratar as coisas com mais profissionalismo, dará enfoques mais maduros e sem bairrismos, enfim, deixará o provincianismo de lado e dará real dimensão à cidade de Joinville. Afinal, há coisas mais importantes do que corujas.
*Manoel Schlindwein é jornalista formado pelo Ielusc e mora em São Paulo