Marly Winckler é socióloga, tradutora, vegetariana há 23 anos, presidente da Sociedade Vegetariana Brasileira e criadora do Sítio Vegetariano. Desde o ano 2000, é coordenadora para a América Latina e Caribe da União Vegetariana Internacional (IVU) , com sede na Inglaterra. Ajudou na organização do 36º Congresso Vegetariano Mundial e está organizando o 1º Congresso Vegetariano Brasileiro e Latino Americano. Nascida na cidade catarinense de Cunha Porã, publicou dois livros:"Vegetarianismo – Elementos para uma Conversa Sobre" e "Fundamentos do Vegetarianismo", além de ter traduzido mais de 50 obras sobre o tema. Em entrevista exclusiva à Revi, Marly demonstra simplicidade e vontade de fazer um mundo melhor.
Onde você obteve sua formação?
Marly Winckler - Sou formada em sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Você ocupa diversos cargos importantes na sociedade vegetariana. Como funciona a divulgação do vegetarianismo e do trabalho que vocês realizam?
Marly - A divulgação do vegetarianismo ocorre em cima de três pilares. O primeiro pilar se baseia na educação, através de palestras, congressos, convenções, cursos de culinária vegetariana etc. O segundo pilar é centrado na área do direito animal, ou seja, na luta judicial para garantir o direito dos animais. Por exemplo, um advogado conseguiu, na justiça, considerar uma chimpanzé um sujeito de direito.
Onde isso ocorreu? Quem era o advogado?
Marly - Foi obra de uma ação do advogado Heron Santana, na Bahia. Infelizmente, quando conseguimos o habeas-corpus para a chimpanzé, ela morreu. Realmente foi uma pena. Mas com certeza isso representa um avanço. Esse tipo de ação nunca existiu no Brasil, e nós vamos lutar para conseguir mais intervenções judiciais.
E o terceiro pilar?
Marly - Ah, claro, o terceiro pilar é a intervenção política. Trabalhar na elaboração de leis e ações judiciais em favor dos animais, junto a políticos favoráveis a nossa causa.
Existe alguma filiação partidária no movimento vegetariano?
Marly - O pior é que não. Nenhum partido hoje defende explicitamente nossa causa.
Nem mesmo o Partido Verde?
Marly - Nem eles, que se dizem comprometidos com o meio ambiente.
Mudando de assunto, vocês têm noção de quantas pessoas são vegetarianas hoje?
Marly - Bem, não temos dados concretos, como um senso ou algo parecido. Mas estima-se que 5% da população é vegetariana ou quer ser.
Na questão econômica, não fica mais caro no fim do mês para uma pessoa se manter com produtos sem origem animal?
Marly - Olha, no “bacião”, por exemplo, em um restaurante universitário, a carne ocupa 42% do orçamento. Se a dieta dessses locais fosse exclusivamente vegetariana, poderia se chegar a uma economia de 30%.
Como é a culinária vegetariana? É muito complicado para as pessoas se habituarem a uma dieta dessas?
Marly - A culinária, além de ser simples, incentiva a criatividade e a valorização de vários grãos, frutas, verduras e sabores que não são muito habituais na mesa comum do brasileiro. Por exemplo, se está muito acostumado a comer o básico arroz, feijão, salada e carne. Na dieta vegetariana, promovemos as nozes, os legumes diferentes, combinações e ingredientes diferentes do leite, dos ovos etc. Você experimentou ali, não experimentou? Sempre trazemos comida vegetariana nas nossas palestras. As pessoas acham que só comemos soja e alface. Não é verdade. A soja ficou famosa por causa dos Estados Unidos, pois lá a soja é bem mais barata que o feijão. Nós temos o feijão, não precisamos comer soja se não quisermos.
É muito dificil substituir a carne?
Marly - Não precisa substituir. É só ter uma alimentação variada. Verduras, legumes, grãos em geral. Claro, entendi sua pergunta: você se refere à proteína. Temos diversas fontes de proteína nos vegetais. Não precisamos comer carne. Se realmente fosse necessário comer carne, tudo bem. Mas não é.
Você considera a Sociedade Vegetariana Brasileira uma ONG ou um movimento social?
Marly - Somos uma ONG, mas podemos nos transformar em movimento social.
Como vocês lidam com a questão do preconceito?
Marly - O preconceito está mudando. Hoje, quase nenhum especialista tem coragem de afirmar que comer carne é necessário e obrigatório à espécie humana. As pessoas estão mais simpáticas aos vegetarianos.