Uma mudança de “ésses” surpreendeu a comunidade ielusquiana. No começo do ano, o que as paredes desconfiavam virou notícia fidedigna. Estava sendo discutida uma dança de cadeiras nas coordenações de dois dos principais cursos da instituição. As trocas foram oficialmente anunciadas pela direção geral no início do ano letivo. Na troca do primeiro S, no Jornalismo, Samuel Pantoja Lima, o Samuca, entregou o posto de coordenador para o professor Silvio Melatti, o segundo S. Na Publicidade e Propaganda, Silnei Scharten Soares, o terceiro S, passou o bastão para Sônia Regina de Oliveira Santos, o quarto S. “Tudo em casa”, como prega o ditado. Samuca está de malas prontas para o além-mar, onde cursará o pós-doutorado em Portugal. Silnei segue para o doutorado na Universidade de Brasília (UnB). Abaixo, conheça um pouco de cada um deles - os que ficam, com a responsabilidade de manter os cursos em alta, e os que saem, com o gostinho de dever cumprido:
Partidão no poder
“Acabei de receber um manual de sobrevivência do Samuca”, contou Sílvio Melatti em sua nova sala, a coordenação de Comunicação Social do Bom Jesus/Ielusc. Ele tomou posse da administração do curso de Jornalismo na quarta-feira (11), e revelou que suas expectativas são “as melhores possíveis”. Sílvio ocupa o lugar do ex-coordenador Samuel Pantoja Lima, o Samuca.
Melatti contou que a maior dificuldade que enfrenta é o ajustamento às rotinas administrativas do novo cargo. Ele acredita que a presença de Samuca - que permanece na instituição até março - durante o processo de adaptação está sendo fundamental. Por enquanto, Sílvio disse estar dando continuidade ao que já foi começado pela administração anterior: “A coordenação antiga deixou um caminho pavimentado”. Sobre o curso de Jornalismo do Bom Jesus/Ielusc, Melatti declarou não enxergar pontos negativos: “Dentro da nossa realidade, estamos muito bem”, apesar dos problemas estruturais, que o coordenador considera proporcionais ao tamanho da instituição.
Sílvio se formou em Jornalismo pela PUC-RS, em Porto Alegre, em 1987. Ainda acadêmico, trabalhou no jornal Correio do Povo. Depois passou pelo Zero Hora, Jornal do Comércio, Jornal NH, Diário Catarinense, A Notícia e Rádio Caxias. Foi também assessor de imprensa do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e diretor do Sindicato de Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul. Em 2004, tornou-se professor do Bom Jesus/Ielusc e, desde então, já ministrou aulas de Redação Jornalística (do primeiro até o oitavo período) e de Projeto Gráfico. Também foi coordenador da Revi de 2004 até 2008. Este ano, Melatti estará a frente da disciplina Produção e Difusão em Meios Impressos, onde está incluso o jornal laboratório Primeira Pauta.
O coordenador do curso de Jornalismo recebeu a Comenda Cruz e Sousa do Mérito Cultural, em 1999, e o Prêmio Literário da Fundação Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em 2001, com o conto "O homem oco". Durante a faculdade, em 1987, sua turma ganhou o Kikito da categoria Super 8, no 15º Festival de Cinema de Gramado, com o filme "O caso Claudete", uma sátira de "O caso Cláudia". Sílvio e Guilherme Difenthaeller, na época colegas de classe, fizeram parte do elenco.
Administradora pragmática
Sônia Regina de Oliveira Santos, a nova coordenadora do curso de Publicidade e Propaganda do Ielusc, deu seus primeiros passos na faculdade em fevereiro de 2007 com aulas de Comunicação Institucional. Formada em Relações Públicas pela Univali, tomou contato com o universo da publicidade na Univille, onde trabalhou por nove anos e organizou jornais-mural, operacionalizou campanhas institucionais, elaborou pesquisas de marketing e foi responsável pelas editorias “Cultura & Lazer” e “Essencial” da revista Universo Univille.
Como coordenadora, Sônia pretende manter o que já foi feito por seus antecessores. Sente-se feliz e desafiada com o convite da coordenação anterior e, quando questionada se o papel da publicidade na sociedade é justo, acha que é necessário haver um compromisso com a comunicação que se propaga, ou seja, avaliar se aquilo que se está vendendo realmente se propõe ao que promete fazer. Diz ser uma professora que em sala de aula prega um ideal e pretende incutir nos futuros profissionais um papel ético.
Sônia, que tem mestrado em Administração e fez sua tese em cima da responsabilidade social corporativa da Embraco, não se identifica tanto com o perfil atual do publicitário — que compreende cada vez mais o negócio de seus clientes como um todo —, pois é da área mais organizacional da publicidade.
Quanto ao Ielusc e o desafio que tem pela frente, a nova coordenadora sente-se segura pois foi bem recebida na faculdade quando se tornou professora. De acordo com ela, o Ielusc, ao contrário de outras instituições de ensino superior, não trata o aluno como um cliente.
O currículo de Sônia mostra uma preocupação com os direitos humanos e com a responsabilidade social: cursos como “Capacitação para voluntários alfabetizadores” na Secretaria de Educação e Cultura de Joinville e “Extensão universitária em conscientização dos direitos e valorização da mulher”, na Univille, figuram na lista.
Harmonia santarena
A brisa santarena balança a rede e o homem deitado nela, imerso em livros. O violão o acompanha, mas a música é o gorjeio dos pássaros da fauna amazônica. O rio Tapajós também descansa. Parece calmo como o sujeito septuagenário, que observa a vida em sua volta, os movimentos. Em 2009, há 21 anos, ele imaginava esse futuro à beira-rio, apesar das mudanças do destino. O que vinha adiante na vida, aos 48 anos, era incerto, mas a idéia de retornar à Santarém do Pará, sua terra natal, parecia se concretizar no presente.
O homem na rede será, possivelmente, Samuel Pantoja Lima, professor, coordenador, jornalista e amigo, mais conhecido por Samuca, que deixa o Bom Jesus/Ielusc rumo a Portugal. Em solo lusitano, ele iniciará seu pós-doutorado — um trabalho no qual analisará as reações do público perante a cobertura jornalística de política, focando em dois periódicos, os jornais O público e Diário de Notícias. Samuca e Celson Lima, seu irmão e professor da Universidade Nova de Lisboa continuarão o projeto de um CD que começaram em 2008. O disco tem influências da música que se faz na Amazônia e no Caribe e de ritmos como o samba e a bossa nova. Para concretizar esses sonhos, Samuel se despede do Bom Jesus/Ielusc, prestes a completar 49 anos em 13 de maio.
O talento musical, que por várias vezes foi comprovado em eventos da faculdade, pode ser genético. Enéias e Oscar Pantoja são, respectivamente, tio e irmão da sua mãe, Oscarina. Os dois participavam de bandas de baile. Oscar cantava e foi músico profissional por toda vida. “Tio” Enéias tocava flauta todos os finais de semana em um conjunto e Samuca pôde assisti-lo na infância em Santarém. Com oito anos, viajou para Gurupá, cidade também do Pará, e ficou três meses na casa do irmão de sua mãe. Essa convivência com a música o fazia imaginar o momento em que estaria no palco. Com 23 anos, aprendeu a tocar violão. Não se dedicou às aulas antes por não ter dinheiro para comprar o instrumento. Isso não o impediu de participar do grupo santareno Canto de Várzea, que fez o primeiro show, intitulado "Amazônia... de mata a sertão", em 1982. Nessa época, ele era um jovem universitário de 19 anos, pretenso físico nuclear, que tinha a rebeldia dentro de si, contra uma das chagas da história brasileira: a ditadura.
Um ano depois da maioridade e Samuca já trabalhava na Rádio Rural de Santarém. Montava o roteiro comercial. Após terminado o serviço, a paixão pela música o impelia à sala ao lado da sua, onde colegas organizavam a programação musical. Contrariava os companheiros, que acreditavam no brega como estilo preferido do povo, sugerindo MPB, bossa nova, Beatles, Rolling Stones e “o caramba” na programação. Em outra função que exercia, ele tinha contato direto com o público. Os ouvintes e clientes explicavam suas necessidades no balcão e ele escrevia um texto em formato radiofônico. Geralmente, eram redigidas propagandas, mas também se usava o veículo, durante o programa “Correspondente Rural”, para enviar mensagens das famílias aos garimpeiros, perdidos em algum rincão da Amazônia. Samuel estava próximo da comunicação, embora ainda distante do jornalismo.
A proximidade aumentou quando Samuca passou no vestibular do curso de Comunicação Social da Universidade Federal de Santa Catarina. Foi integrante da 5ª turma e se formou em 1989. A ponte familiar entre ele e o jornalismo é o cunhado, Manuel Dutra, jornalista e professor universitário “muito conhecido na região norte”. Durante a fase de aluno do ensino superior, carregava a música consigo, apresentando-se em bares. Estudava jornalismo e trabalhava no Banco do Brasil, onde permaneceu de 1981 a 1997. Já com o bacharelado em jornalismo, Samuel retornou a Santarém e exerceu a profissão de "jornalista autônomo" por um ano. Em 2000, ele passou a compor o quadro de professores do Bom Jesus/Ielusc, assumindo a coordenação do jornalismo três anos após sua chegada.
A doçura da música e a acidez da carreira jornalística afastaram o sonho infantil: ser físico nuclear. Samuca até estudou física em Belém, mas “o curso era muito ruim”. Queria conhecer as razões do universo. Do aprendizado, resta um conhecimento peculiar sobre a vida, um entendimento que se pode chamar de sabedoria. Samuca consegue harmonizar os mundos ao seu redor. Faz coexistirem o músico, o jornalista, o poeta, o intelectual, o amigo, o docente e o pai de três filhos — Galeno Pantoja, Bárbara e Clara Duwe — em um mesmo homem, embora não se considere nem metade dessas palavras. Eis a sua auto-definição: "Gonzaga fala de ser um eterno aprendiz. Prefiro me comportar assim, sem falsa modéstia nenhuma".
Foram nos quase 10 anos de Bom Jesus/Ielusc que Samuel descobriu o que significa ser um docente. No entanto, só acreditará que é um professor com o amadurecimento, “talvez, daqui a 20 anos”. Durante esse período, que ele considerou “extraordinário”, incentivou os estudantes a tomarem gosto pelo conhecimento. Samuca tem uma visão holística de teoria e prática, cuja relação ele compara a de corpo e alma. O texto jornalístico, para ele, deve ter algo além da informação: o “sabor da narrativa”. Este tempero conquista o leitor. O lide e a forma asséptica de fazer notícia não garantem que o interesse permaneça até o final da história. Samuca cita Ernest Hemingway e o texto no qual a descrição do pôr-do-sol de Madri inaugura o primeiro parágrafo — a pauta era sobre turismo —, frisando que o leitor é cativado mesmo se a informação principal não estiver encabeçando o texto. Para ser bom jornalista, Samuel considera indispensável firmar as bases intelectuais. Da sua presença no Ielusc “fica a convivência boa, fraterna” e a sua inconfundível frase de despedida: “Beijos no coração”.
Homem do cinema
Ele é o Quarto Homem do Clube de Cinema (CdC). Um sujeito discreto, um amigo paciente. Para o acadêmico do 5° período de Jornalismo Pedro Guerra e a ex-aluna Pollyanna Niehues, que assim o descrevem, Silnei Scharten Soares já está fazendo falta. No Ielusc desde 2001, o professor foi coordenador do curso de Publicidade e Propaganda durante o ano que passou e se despediu da instituição na segunda-feira (16), quando viajou para Brasília a fim de dar início ao doutorado em comunicação na UnB.
Graduado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) em 1994 e com mestrado em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Silnei é apaixonado pelo cinema. Caio Biagiotto, integrante do CdC, o descreve como uma fonte ambulante de conhecimento cinematográfico. “Ele é o velhaco, o que gosta de filmes mais antigos. Mas é também o que conhece mais”, conta. Mesmo longe, o professor garante que não perderá contato com o clube. Ele diz que está afetivamente ligado ao grupo e dará sugestões sempre que possível, em caráter de colaborador.
No Ielusc, Silnei foi também coordenador do Necom (Núcleo de Estudos em Comunicação), trabalhou na organização dos Ciclos de Estudos e no projeto de pesquisa intitulado “A ciência como ficção: análise semiótica da narrativa cinematográfica e das histórias em quadrinhos”. Foi membro da comissão avaliadora de projetos de pesquisa do Artigo 170, do corpo editorial da revista Rastros e do Comitê de Ética na Pesquisa, o que explica a imagem de “um professor sempre envolvido com algum projeto que diz respeito à faculdade” que ele transmite, segundo a acadêmica Gisele Pimpão.
“Toda renovação é positiva”, acredita Silnei. Ele conta que ficou feliz com a mudança no quadro docente da instituição pois, apesar das diferenças e discordâncias, o clima que prevalece é o de respeito e camaradagem. Segundo o professor, esse novo grupo está bastante empolgado e veio com muita vontade de trabalhar. “O curso tem tudo a ganhar com o ingresso dos novos professores. Não vejo prejuízo nenhum”, afirma. Além do corpo docente, Silnei também aposta na nova coordenação de Publicidade e Propaganda: “A Sônia é organizada, tem um perfil de administradora, de quem faz acontecer”.
Sobre o período em que esteve à frente da coordenação de PP (em 2004 e em 2008), o professor avalia como um trabalho árduo, mas recompensador. As amizades que conquistou e a união dos docentes são as principais marcas que ficaram em Silnei. Daqui pra frente, fazer o doutorado e voltar a lecionar são os planos deste “mestre, em todos os sentidos da palavra”, conforme Pollyanna.