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Matéria 7364, publicada em 27/10/2008.


:Tuane Roldão

Para Nara, distanciar-se de Guimarães Rosa empobrece o vocabulário

Leitura de Guimarães Rosa teve público baixo, mas constante

Tuane Roldão



Além da doutoranda em Literatura e professora do Ielusc, Nara Marques Soares, quatro acadêmicos de jornalismo encontravam-se na sala C-32 às 19h de sexta-feira (24 de outubro), horário previsto para o início da leitura de Guimarães Rosa, agendada dentro da programação da Semana Acadêmica do curso de Comunicação Social. Vinte minutos depois, quando Nara começou de fato a falar sobre o escritor mineiro, 14 pessoas, entre alunos e professores, dividiam espaço com ela e permaneceram ali até o final da leitura.

A professora iniciou revelando os motivos que a fizeram optar por Guimarães e não por Machado de Assis, as duas alternativas que a Coisa (Comissão Organizadora Independente da Semana Acadêmica) deu a ela. “Entre o centenário de vida de um e o centenário de morte de outro, acredito que dá mais sorte trabalhar com o nascimento”, brincou. Mas, “falando sério”, justificou sua escolha como uma tentativa de aproximar os presentes da obra de Guimarães, que, segundo ela, é ensinada pelos professores como literatura regionalista, motivo do distanciamento e desgosto dos leitores. O desejo da doutoranda é retomar essa linguagem “tão linda”, cuja falta nos empobrece o vocabulário.

Quanto à biografia do escritor, Nara preferiu “não massacrar os ouvintes com detalhes” e comentou apenas alguns dados da vida dele. Entre eles, o período em que Guimarães foi diplomata brasileiro na Alemanha e concedeu passaportes para judeus, o que, para a professora, foi “seu jeitinho brasileiro de combater injustiças”. Falou também sobre a paixão do mineirinho pelas diversas línguas e citou uma entrevista que ele concedeu a um estudante, assim que ingressou em um colégio de padres alemães, em Belo Horizonte.

Para fazer a leitura, a professora escolheu o conto “A terceira margem do rio”, pois, além de ser uma de suas obras favoritas, esse texto dá abertura para várias formas de leitura. Nara contou que as pessoas costumam cair em uma leitura psicanalítica, por conta da relação entre pai e filho que o autor traz. Comparou o pai a Buda, em seu desejo de se afastar da sociedade e, além disso, falou nas relações antagônicas que podem ser observadas no conto, como bem e mal, certo e errado, vida e morte. Ela explicou que sua idéia é pensar em uma terceira possibilidade, a história oculta de cada um desses pontos. E adiantou: “Minha leitura será sobre a relação conflituosa entre o dito e o não dito”.

Após ler o conto, a doutoranda mostrou um curta-metragem produzido pela artista plástica Tereza Moura, intitulado “Francisco”, em que ela utiliza a técnica da xilogravura para montar a animação. Em sua leitura, Nara questionou a necessidade do filho de falar diante do silêncio do pai e fez indagações sobre o que se espera da paternidade. Apontou a loucura como única herança deixada na tradição da família em questão. Para a professora, o filho precisou inventar um pai e exaltá-lo, já que o dele estava ali, mas não se comunicava.

Passou a analisar o filho como narrador, mas não soube dizer quem é o protagonista da história: o pai ou o filho. A professora acredita que o rio é o terceiro personagem do conto e o aponta como uma representação de mudança e eternidade. Para “alegrar o ambiente”, mostrou um vídeo em que Milton Nascimento e Caetano Veloso cantam a música “A terceira margem do rio” e falam sobre as pessoas do interior, fonte de inspiração de Guimarães Rosa para a construção do conto. Para finalizar, Nara conversou de forma descontraída com o público e elogiou o escritor: “Ele sabe brincar com a linguagem”.

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