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Matéria 6442, publicada em 17/06/2008.


:Djulia Justen

O livro é dedicado a 12 "cavaleiros", entre eles, Euclydes da Cunha

Ariano Suassuna e seu reino de pedra e sonhos

Ariane Pereira


Um tijolo maciço de 742 páginas, mistura de prosa e verso com gravuras épicas, armoriais e epopéicas. O livro todo, aliás, é uma epopéia: é o intento de Pedro Dinis Ferreira-Quaderna, o caricato personagem principal, em meio às suas esperanças de ser o “Gênio da Raça Brasileira”, escrevendo a “Obra da Raça” — uma obra-prima, que misturaria todos os estilos literários existentes com maestria e seria tão importante para a nação que consagraria seu autor.

Dom Pedro Dinis Ferreira-Quaderna é um tanto quanto confuso. Crescido entre dois militantes radicais — o professor Clemente, negro, de esquerda, do povo, e o doutor Samuel, branco, da direita, fidalgo e poeta — junta tudo quanto é ensinamento que seus mestres lhe dão e os joga no liquidificador. O resultado é um “monarquista de esquerda”, velhaco, católico-sertanejo — religião fundada por ele mesmo e que lhe permite saciar vários apetites carnais — e bem covarde. Reconhece sua covardia, e assim, prefere assumir o trono da Pedra Bonita, em Pernambuco — ao qual tem direito legítimo, apesar de ser o caçula da família, por ter persuadido seus irmãos a assinarem um documento no qual renunciavam o trono — apenas através da literatura, escrevendo a já citada “Obra da Raça”. Os Quadernas são descendentes de Dom João II, O Execrável, um sanguinário que reinou na Pedra Bonita de 1835 a 1838. Para Quaderna, esse teria sido o verdadeiro reino do Brasil. Em seus delírios de grandeza, Dom Pedro II e outros Bragança são impostores.

Dom José Sebastião Garcia-Barretto, padrinho de Quaderna e que já começa a história morto de forma enigmática, é elevado a rei pelos sonhos monárquicos do afilhado. Seus filhos são representantes do antagonismo que entremeia todo o livro. Arésio, o mais velho, é a natureza selvagem do homem: inconseqüente, má, sensual. Sinésio, o caçula, é seu oposto: um jovem casto, distante. Isso sem falar em Clemente e Samuel, a esquerda e a direita, respectivamente, que durante o livro todo se debatem em discussões políticas, filosóficas, literárias e religiosas.

As tais pedras do reino, que nas palavras de Dom Pedro Dinis Ferreira-Quaderna são “as torres do meu Castelo, da Catedral encantada que os Reis meus antepassados revelaram como pedras-angulares do nosso Império do Brasil”, e que até mesmo para ele lembram dois obscenos objetos fálicos, realmente existem. Mas não ficam em Taperoá, na Paraíba, que é onde se passa toda a história, e sim em São José do Belmonte, Pernambuco.

A Pedra do Reino demorou 13 anos para ser concluída e parte de algumas experiências pessoais de Suassuna: o assassinato do pai em represália ao assassinato do presidente João Pessoa, as lutas de sua família e as perseguições sofridas.

Em 2007 a obra ganhou uma adaptação para a TV, dirigida por Luiz Fernando Carvalho. A teatralidade, presente no texto, é realçada. As cores e a música, tão pulsantes mesmo no livro, são transpostas com maestria para a tela. Entretanto, para os moldes da Globo, a microssérie de nome A Pedra do Reino foi um fracasso. Em sua estréia, a emissora ficou em terceiro lugar no Ibope com uma audiência de 12 pontos, a menor do canal nesse horário.

Mas nenhuma palavra vã pode suplantar o “estilo régio” de Ariano Suassuna guiando a mão de Dom Pedro Dinis Quaderna. Essa obra não é feita apenas de simples palavras escritas num papel. É de sonhos, cores, música e sangue. “é romance, é odisséia, é poema, é epopéia, é sátira, é apocalipse...”, nas palavras da grande Rachel de Queiroz, no prólogo do livro.

O Romance d'A Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta pode ser encontrado na Biblioteca Castro Alves, no Bom Jesus/Ielusc.


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