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Matéria 5539, publicada em 15/02/2008.


:Djulia Justen

Fernanda (ao fundo) ouve os comentários do professor Antônio Carlos do Santos (dir.)

Monografia analisa a modernidade através da literatura

Melanie Peter


O relógio marcava 17h05 e a estudante de jornalismo Fernanda Heiler fazia as palavras reverberarem por entre as paredes da sala C-21. “Prefiro não falar... Neste exato momento prefiro não dizer absolutamente nada. Não aceito que minha voz saia fazendo eco pela sala. Prefiro não falar qualquer coisa. Mas na tentativa do silêncio, minha voz escapa de mim. Não sei de onde vem essa minha vontade antagônica... deixar que minha voz forme palavras que desenvolvam conceitos e espalhem significados pelo mundo ...”. Aproximadamente 45 minutos mais tarde vinha o resultado. A monografia intitulada “'PREFIRO NÃO...': uma leitura de Bartleby e de sua resposta às muitas perguntas da sociedade moderna” foi aprovada com nota 9,0.

Orientada pela professora Nara Marques, a pesquisa de Fernanda começou com uma inquietação quanto ao personagem Bartleby, criação do escritor Herman Melville em 1853. “Seria ele fruto da modernidade ou resistência a ela, ou ambas as coisas ao mesmo tempo?”, indagava a si mesma. Ao embarcar no estudo da obra de Melville, a estudante enfrentou uma densa análise da sociedade moderna, do isolamento, da solidão e do afastamento comuns entre as multidões. “Então a única saída possível – o final – desta sociedade é a resistência ou a entrega a ela?”, era mais uma das indagações na qual mergulhava.

Fernanda HeilerDurante a construção da monografia, Fernanda deparou-se com uma série de outros anti-heróis que, assim como Bartleby, vivem às margens da sociedade e da história tradicional. Entre eles pairavam o flâneur de Baudelaire, o personagem de Edgar Allan Poe em O homem da Multidão, o Carlitos do filme Tempos Modernos e a Dora de Central do Brasil. Comparando, analisando e esmiuçando cada uma destas personagens a estudante promoveu um diálogo em torno de questões como exclusão, frivolidade, afastamento.

Quando encerra a conclusão da monografia, a estudante arrisca um último questionamento. “Minha proposta inicial foi fazer uma leitura de Bartleby apontando-o como um personagem que resiste à modernidade. Ao longo do trabalho, pude constatar que Bartleby procurava sua exclusão por conta própria, mas sem um bem maior por trás como um objetivo social ou qualquer outro, por isso o denominei dissidente e não um subversivo, integrado ou frívolo. O caso de Bartleby é apenas um entre muitos, pois ele cria a potência do neutro. Mas quantos outros não existem?”

Sem muitas objeções ao trabalho de Fernanda, a banca, composta pelos professores Antônio Carlos dos Santos e Alvaro Dias, aproveitou a oportunidade para pensar adiante e apontar outros caminhos possíveis. O primeiro argüidor foi Antônio, professor convidado. Com um tom de voz beirando a ironia ele entrou no jogo e disse que também “preferiria não” falar sobre a noção de modernidade. “Quando a gente fala de modernidade nos adentramos num pântano”, falou. Porém, na sua opinião, a noção modernidade apontada no trabalho de Fernanda está demasiadamente ligada à tecnologização, sendo que este é apenas um dos aspectos deste período.

Contrariando com fervor a lógica aristotélica, Antônio citou Nietzsche, o eterno e o efêmero e a fórmula de Baudelaire sobre o ser e o não ser ao mesmo tempo. Acreditando que através da ficção podemos entender melhor a realidade, ele diz ser possível pensar Bartleby como um perfeito personagem moderno, "alguém que é e não é ao mesmo tempo".

“O conto de Bartleby também mexeu comigo” foi a primeira frase dita por Alvaro Dias na sua argüição. Para ele, o trabalho está muito inteligente, embora feito por um narrador que está sempre do lado de fora, apenas julgando. Como sugestão, ele propõe a Fernanda o abandono das fórmulas de narrador, pois este, assim como o flâneur, não possui reflexo. “A partir de agora transforme-se em uma personagem. Porque é bom ser personagem”, finalizou.

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