Era de se esperar o salão cheio para a solenidade. O nervosismo de Ana Paula Fanton (Jornal) também já era previsto. A tranqüilidade e finesse do orientador Jacques Mick na condução da monografia “O ethos da política e o ethos do jornalismo: Uma análise comparativa de textos de A Notícia e da assessoria de imprensa da Câmara de Vereadores de Joinville” também já estavam no script. Nem a desenvoltura dos comentários dos professores Samuca e Sérgio Murillo foi inesperada. Platéia quieta. Tudo como previsto. Nada fora dos padrões. E não podia dar em outra: Ana Paula foi aprovada.
O rito começou com 10 minutos de atraso, como já é de praxe. Após quatro minutos de fala compassada do mestre-de-cerimônias Jacques, a estrela de Ana Paula já começou a brilhar, tanto para seus avaliadores quanto para as outras 80 pessoas presentes na sala C-27, entre amigos, acadêmicos e professores. A agora egressa explicou como se deu o ano inteiro de pesquisas para a realização do seu trabalho de conclusão do curso. A pesquisa trafegou, sem maiores variações, entre releases de assessoria de imprensa da câmara e as notícias de A Notícia. Pelo que se pôde entender, ambos não eram assim tão diferentes. Sob a luz de Nicolau Maquiavel, Venício de Lima, Perseu Abramo e Francisco Karam, Ana Paula analisou dois recentes e emblemáticos casos que retratam bem como se dá, no cenário joinvilense, a relação entre os dois ethos – imprensa e política – tratados no trabalho: os casos da tentativa de suborno por parte do vereador Lauro Kalfels (hoje presidente do conselho de ética da CVJ) a uma jornalista e da divisão igualitária dos salários no gabinete do vereador Adílson Mariano.
O nervosismo visível na fala de Ana Paula merece um capítulo à parte. Como é de conhecimento geral, as defesas de monografia tiram os donos do trabalho do sério. Durante a meia hora em que falou, a estrela do cerimonial transitou por diferentes tons de voz, jogou a cabeça para os lados, girou o anel da mão direita muitas e muitas vezes, olhou para cima, arrumou o cabelo, tudo para ver se conseguia espantar a nervosidade. Até o momento em que não deu mais para disfarçar: no meio da fala, o datashow perdeu o sinal da apresentação que vinha do computador, e a tela se apagou. Nada muito sério, na verdade, afinal bastava mexer o mouse ou apertar qualquer botão do teclado. Mas foi o suficiente para que a fala desandasse por mais de 10 segundos em gagueira, seguida de um suspiro profundo e, aí sim, a retomada da tranqüilidade.
Quando a audiência já começava a se revirar nas carteiras e se dispersar, chegou a vez dos convidados da festa se pronunciarem. Primeiro falou o presidente reeleito da Federação Nacional dos Jornalistas e professor licenciado do Ielusc, Sergio Murillo de Andrade. Murillo criticou o tom jornalístico do texto de Ana Paula, e também a opção dela de considerar a mídia como um lugar de decisão do poder. “A gente tem mania”, diagnosticou Murillo, “de dizer que a mídia é um espaço de poder. Mas isso não é verdade. Ela só pode ser um espaço de reprodução do poder”. O professor também salientou a premência do papel fiscalizador da imprensa, e condenou a posição preconceituosa dos estudantes de jornalismo contra a própria profissão que escolheram. Às 20h19, após a resposta à primeira parte da argüição, entrou em cena o professor Samuel Lima, citando "Baticum", música com letra de Chico Buarque, e realizando críticas à superficialidade do conceito de ethos apresentado e apontando erros de metodologia, além do pouco aproveitamento das teorias de autores referência na monografia de Ana Paula.
Quando os convidados e o mestre-sala deixaram o salão para deliberar, foi a hora da imprensa. Eram os acadêmicos da disciplina de Redação 5, que fariam um texto com base na defesa. Mas eles não tiveram muito tempo para trabalhar. Bastaram 6 minutos para que os homens de decisão voltassem à C-27 e anunciassem: com conceito 8, Ana Paula Fanton estava aprovada. Um pouco mais aliviada, ela falou à Revi que trabalhar na assessoria de comunicação da Câmara auxiliou bastante na execução do trabalho. Aliás, foi o que atraiu o olhar dela para o assunto. Agora, depois de um ano analisando releases, ela é responsável por produzi-los. Desde fevereiro é assessora de imprensa de Adílson Mariano. “O problema do texto de release é ser carregado de opinião. Por isso, sempre que eu faço e fico em dúvida, releio e vejo se enalteci demais o político”, conta. E na hora da dúvida entre o ethos da política e o ethos do jornalismo? “A decisão é sempre do vereador que eu assessoro...”. Do início ao fim, nada fora do planejado.