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Matéria 3796, publicada em 08/03/2007.


:Eva Croll

Uma freira no campus: menos diferença do que se imagina

Fabiana Cândido relata sua experiência como religiosa e acadêmica

Cláudia Morriesen

Em meio ao mar de cores das roupas dos jovens acadêmicos apressados em alcançar o diploma e uma carreira de sucesso, a calma de uma acadêmica sempre de branco parece destoar do cenário. Ainda que considerada uma das melhores alunas do 5º período de enfermagem, a jovem de 28 anos garante que dinheiro nenhum pagaria o trabalho para o qual está estudando. Mas o voluntariado não é raro na comunidade de Fabiana Aparecida Cândido: ela faz parte do grupo religioso Pequenas Missionárias de Maria Imaculada.

Natural de Lorena, cidade interiorana de São Paulo, Fabiana começou a pensar em seguir uma vida religiosa no início da adolescência. “Via meus amigos 'ficando', tendo relacionamentos sem sentimento e pensava: não quero isso pra mim”, conta. A decisão de entrar para o convento foi tomada aos 14 anos, quando Fabiana conheceu a congregação missionária em um retiro espiritual. A notícia foi bem recebida pela família, católica praticante, ainda que a superproteção sobre a caçula levasse os irmãos a questioná-la constantemente. “Meu irmão mais velho dizia: você vai e eu te apóio, mas se em algum momento você desistir, me liga que eu te busco na hora”, lembra a jovem que deixou a família aos 16 anos para iniciar o aspirantado, primeira fase na formação eclesiástica.

A certeza de ter seguido o caminho certo, no entanto, nunca a abandonou, apesar de em alguns momentos Fabiana ter examinado a própria decisão. “Como perdi meu pai e meu irmão mais velho ainda na infãncia, me perguntava se não estava tentando preencher o vazio da figura masculina ou, talvez, fugindo dela”, relata. Mas desde sua entrada na congregação ela não pensou mais em desistir para casar ou ter filhos. “Acho o matrimônio muito bonito, mas é necessário vocação para ele assim como para a vida religiosa. Eu não conseguiria cuidar de apenas uma família, agora que tenho vários filhinhos”, analisa, brincando com a relação que tem com os pacientes do Hospital Regional Hans Dieter Schmitd, onde sua congregação mantém uma casa com 12 freiras voluntárias.

O Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada, do qual Fabiana faz parte, é uma associação religiosa criada nos anos 30 na cidade paulista de São José dos Campos com o intuito de abrigar e tratar jovens tuberculosas e atualmente conta com comunidades religiosas instaladas em seis estados brasileiros, duas em Portugal e uma em Roma. Além de trabalhar na administração e na enfermaria dos hospitais, as freiras do instituto ainda mantém escolas, creches e asilos. Assim que fez os votos, aos 20 anos, Fabiana foi transferida para atuar como enfermeira em Joinville. Aplicada, fez um curso técnico de enfermagem antes de iniciar a graduação e assim que concluir o segundo curso, deseja estudar fisioterapia, como outras religiosas que se especializam para o trabalho praticado voluntariamente.

Apesar de se auto-intitular tímida, Fabiana confessa que é chamada de “noviça rebelde” pelos colegas de faculdade. Ainda que no início do curso a recepção tenha sido acompanhada do receio, aos poucos os outros estudantes de enfermagem aprenderam que as diferenças eram mínimas. A colega Maria Zilar conta que a irmã ― como Fabiana é chamada pelas outras acadêmicas ― é o ponto de equilíbrio da sala. “[Ela] fez nossa turma ter mais integração, porque conversa com todos na sala”, acrescenta a colega Tatiana Célia. Achando graça do interesse sobre como sua vida é levada, Fabiana explica: “Sou uma pessoa normal, só tenho um trabalho diferente e aprendi a ter um comportamento mais discreto”. Mas ela sabe que a antiga imagem rígida de padres e freiras contribui para a reserva de algumas pessoas em relação àqueles que usam hábito, mas não concorda com essa postura. Para ela, a seriedade dos membros da igreja são coisa do passado ― ou da Europa ― e afirma que o comportamento despachado que a diferencia de outras religiosa é o chamado jeitinho brasileiro: “Eu vejo essas freiras doidas que passam na rua com cara fechada, não olham para o lado nem para dar 'oi' e não posso acreditar”, surpreende-se.


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