O final do 2º turno das eleições intensificou um debate que vinha sendo suscitado, desde o começo do período eleitoral 2006, por críticos e observadores da mídia. Por enquanto, a discussão ainda está restrita aos sítios da internet dedicados à reflexão sobre o papel da mídia, como é o caso do Observatório da Imprensa e do Comunique-se, bem como dezenas de blogs de jornalistas.
Duas premissas devem ser colocadas para que esta reflexão seja produtiva. A primeira, entender o jornalismo como prestação de serviço à comunidade, especialmente no campo da radiodifusão. A segunda é perceber a informação como um bem público.
Nestes termos, o debate sobre o papel da mídia na sociedade atual é algo imprescindível à caminhada democrática do País. Se for correto afirmar que a imprensa não “derruba governos”, é igualmente forçoso reconhecer que, como afirma o jornalista Luiz Nassif, “a imprensa só derruba governo quando ele não tem sustentação. Por isso, quando querem derrubar governos, campanhas de mídia visam erodir sua sustentação. A queda é mera coincidência”. Não creio em complô, mas em parcialidade explícita. Isto é fato.
Embalada por uma opção política muito clara, a mídia de expressão nacional enveredou pelo descaminho do que eu chamo de protagonismo antidemocrático. O tom exacerbado, no limite da intolerância, da presunção de culpa e do ódio de classe tomou conta das páginas, por exemplo, da revista Veja e de jornais como Folha de S. Paulo, Estadão e O Globo e da tela da TV Globo, salvo honrosas exceções.
É mister reconhecer que a simples existência do debate já é, em si, um saldo positivo do processo. Noutros tempos, o assunto seria liminarmente relegado ao silêncio. Essa avaliação crítica foi, finalmente, suscitada num grande jornal, a Folha de S. Paulo, pelas mãos do jornalista Marcelo Beraba (“O debate necessário”, artigo publicado em 05/11/06, pg. A6).
Há bons elementos a indicar qual será o comportamento da mídia no segundo mandato do presidente Lula. As principais revistas semanais dão o tom da conversa: (a) Veja: “A última chance” - e tasca seu julgamento sumário afirmando que o primeiro mandato de Lula foi pífio; (b) Época: “Como serão os próximos quatro anos” - reduziu o tom beligerante, e foi ouvir as expectativas sobre os próximo quatro anos de cinco ministros, quatro governadores eleitos e três dezenas de parlamentares; (c) ISTOÉ: “Agora vem a parte mais difícil” – para quem o desafio do presidente reeleito é mostrar que seu projeto de governo pode levar o País a crescer; (d) CartaCapital: “A luta pelo futuro” - joga luzes sobre a disputa entre desenvolvimentistas e monetaristas, no âmbito do governo reeleito, e afirma: o que está em jogo é o crescimento que o Brasil precisa.
Por ora, fico com a avaliação de Marcos Coimbra, Diretor do Instituto de Pesquisa Vox Populi: “A vitória de Lula mostra como se estrutura hoje a opinião pública e revela quanto o nosso povo recusa a tutela daqueles que, até agora, gostavam de se considerar formadores de opinião”.
Samuel Lima é doutor em mídia e teoria do conhecimento pela UFSC e coordenador do curso de jornalismo do Bom Jesus/ Ielusc.