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Matéria 2510, publicada em 30/08/2006.


RBS e AN: os riscos da monopolização

Jacques Mick e Samuel Lima

A intenção do grupo gaúcho RBS de comprar o jornal, A Notícia era uma velha novidade. Nos meios acadêmicos e profissionais, por mais de dez anos o assunto foi tratado como possibilidade. Agora, enfim, está confirmado que a RBS assumirá a gestão do jornal joinvilense no dia 21 de setembro. Fato consumado, resta-nos discutir os impactos da transação para a sociedade e a formação da opinião pública.

Os veículos envolvidos informaram em 25 de agosto que o negócio havia sido fechado no dia anterior, que o empresário Moacir Thomazi ficará no jornal por mais um ano e que o AN “poderá ficar com a atual abrangência” (o condicional é altamente significativo). O valor da transação não foi informado oficialmente, mas as cifras do negócio oscilam entre R$ 50 e R$ 80 milhões. O AN, com 83 anos de atuação, emprega 512 trabalhadores e faturou, em 2005, R$ 30,3 milhões. O império regional da família Sirotsky faturou R$ 860 milhões e lucrou R$ 93 milhões no ano passado.

Com a aquisição do AN e o lançamento do diário popular Hora de Santa Catarina (no último dia 28), o grupo gaúcho amplia seu número de jornais de seis para oito. Somadas, as tiragens desses veículos superam em muito a do principal diário do país – chegarão em breve aos 600 mil exemplares. O monopólio da mídia, mesmo nesse formato regionalizado, tem peso desproporcional na sociedade civil. A tendência à concentração e ao monopólio no setor remonta o final dos anos 1960, a partir dos Estados Unidos, e é um fenômeno mundial. No Brasil, o quadro é dramático: o conteúdo jornalístico e/ou midiático servido à sociedade é controlado, direta ou indiretamente, por literalmente meia-dúzia de famílias neste começo de milênio.

O anúncio da venda do AN à RBS configura-se como um duplo desserviço para Joinville e para Santa Catarina. Em primeiro lugar, atenta contra a democracia, na medida em que concentra ainda mais a propriedade dos meios de comunicação, subtraindo da esfera pública catarinense uma outra possibilidade de cobertura dos acontecimentos. O fim da concorrência – por menor que fosse – abre um espaço maior para manipulações de toda ordem, e a imprensa brasileira é pródiga em exemplos dessa natureza.

Em segundo lugar, ficaremos cada vez mais expostos ao chamado “pensamento único” na mídia, porta-voz da ideologia de que há apenas uma versão da verdade. A voz única é emburrecedora, e contrária aos interesses da cidadania. Entre outras conseqüências, restringe sensivelmente a pluralidade das fontes de informação, estreitamento que poderá ser especialmente grave na cobertura dos assuntos de interesse de Joinville e região.

A sociedade civil reagirá à venda do maior e mais tradicional diário de Santa Catarina ao grupo RBS?


Jornalistas, são professores do curso de Jornalismo do Instituto Bom Jesus/Ielusc, em Joinville (SC). São doutores pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

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