Revi Bom Jesus/Ielusc

>>  Joinville - Quinta-feira, 21 de novembro de 2024 - 17h11min   <<


chamadas

Matéria 2031, publicada em 20/04/2006.


:Bruna Nicolao

Crianças brincam na cabana indígena do shopping

"O dia do índio não tem", diz jovem Guarani

Bruna Nicolao


Freqüentadores das ruas de Joinville na venda de artesanato, os índios Guaranis-Embya tiveram um dia diferente na praça de eventos do Shopping Mueller. Um dia de homenagem, quem sabe, ou de oportunidade.

Um chão forrado por lona de caminhão e uma cabana montada com folhas de palmeira laçadas por cordas. Onças, corujas, jacarés, tartarugas de madeira. Cestos de palha, chocalhos e arcos de flecha coloridos. São objetos simples esparramados no chão do shopping, aos pés calçados do índio guarani, que estavam a espera de algum interessado para levar um bichinho para casa.

O guarani Júlio da Silva tem 24 anos. Demonstra medo ao conversar, pois mal fala o português. Está caracterizado como qualquer cidadão urbano não fossem os cabelos negros e lisos, a cor da pele parda e os olhos quase pretos que não escondem sua origem. O que tenta esconder a raiz indígena é a camiseta branca, os tênis um pouco gastos, e as calças pretas e largas com “hip hop” escrito em vermelho.

Escadas rolantes e elevador de vidro com vista panorâmica, vitrines fartas de produtos caros e importados, como um tênis de R$ 400,00 e um colar de brilhantes por R$ 750,00 são os companheiros de cena da pequena e robusta cabana composta por objetos simples artesanais podendo ser comprados a R$ 3,00.

Na tarde de 19 de abril, o dia do índio, uma turma de crianças estava por ali compondo o cenário da exposição. Eram quase 40 meninos e meninas de três a quatro anos acompanhados por duas professoras. Elas estavam agitadas com os bichinhos expostos e algumas fazendo cara feia com a fumaça de gelo seco simulando uma fogueira. Os professores observavam a agitação um pouco desanimados com a exposição. “Cadê os indiozinhos de verdade? Ninguém vai contar uma história para eles?”, comenta uma das educadoras da escola Padre Carlos para a colega. E o índio ficava imóvel, em pé, observando as crianças que o olhavam esperando algum outro acontecimento além da fumaça que as deixava mais agitadas. Depois de dez minutos, elas se foram organizadas em fila.

Júlio parou de estudar no ensino fundamental na própria aldeia, que oferece aulas em língua portuguesa e guarani. Hoje trabalha na agricultura e faz artesanato na aldeia Jaboticabeira, em Araquari. Ele planta batata-doce, feijão, mandioca e milho. Fala orgulhoso que já fez curso de como cultivar maracujá. Ainda tem um sonho de fazer um curso técnico de auxiliar-administrativo.

Os índios ainda tentam buscar um espaço que lhes foi tomado há anos. Precisam dos brancos para ganhar dinheiro. O dia do índio? É como qualquer outro. Para ele tanto faz ser feriado. “O dia do índio não tem. O pajé falou que o índio foi massacrado. Porque tão matando tudo”, fala o índio, rindo.

800x600. ©2005 Agência Experimental de Jornalismo/Revi & Secord/Rede Bonja.