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Matéria 1414, publicada em 16/09/2005.


A nostalgia contemporânea e o “museu de grandes novidades”

Jessé Giotti

As rádios são o que eu sempre achei que fossem — mas nem pensava nisso, foi um raciocínio pós-observação. O Zeguedé é um sujeito grisalho e formal. Gaba-se de sua experiência e das opiniões que “cunhou”. E a nostalgia, nossa!, como esse pessoal de rádio é nostálgico. “Que saudades do bolachão”, diz um. “Naquele tempo [o tempo do bolachão] era que se trabalhava em rádio”. “Aquilo sim que era trabalho” — quase disse, mas me contive. “Agora o computador faz tudo”, lamenta Silvio Jacon. Agora já não pesa o equipamento de outrora, agora os bolachões já não quebram, a cobertura esportiva não é tão penosa, só resta mesmo a saudade. Ele continua fazendo a mesma locução, com quase a mesma voz. Durante o tempo que lhe “sobra”, quando o computador “faz tudo”, ele toma cafezinhos. E a tecnologia, essa desvairada, não pára. “O tempo em potência está para o inócuo como para o criativo. E há ainda muito mais”, devem dizer os tecnológicos.

É provável que alguém sinta falta do rádio ao vivo, quando cantantes iam ao estúdio soltar a voz, falta da TV em preto e branco e até da máquina de escrever. São os nostálgicos incuráveis. Esse pessoal que nasceu, parece, em épocas anacrônicas a suas habilidades, os saudosistas, os reacionários, todos de algo contemporâneos. Mas todos em seu devido tempo — de que outra forma? — lamentam. No máximo podem se aliar aos conservadores e aos pudicos para garantir o que lhes resta.

Zeguedé ainda conta como, em “seu tempo”, o ingresso na profissão era diferente. “Tinha que começar como técnico de som, só então passava para a locução. E pra isso tinha que ser bom”. “Hoje”, diz ele, “com qualquer mil reais o cara tem um programa”.

Talvez esteja no radiojornalismo a maior conformidade do meio com o seu tempo. Não segundo o radiojornalistas de Joinville. As notícias são selecionadas entre dezenas de e-mails, formatadas e narradas. A rádio mantém em seu cerne, ainda, a oralidade. No mais são informações que chegam via internet, via mídia impressa e telefone. O esforço está em encontrar uma notícia e passá-la adiante via ondas de rádio. A opção para os radiojornalistas está entre fazer a reportagem e apresentar o programa com reportagens pré-prontas. Mas a primeira opção implicaria em deixar o estúdio às moscas. Falta estrutura, faltam jornalistas e sobram projetos.

Mas há também o programa que se anuncia como o salvador da cultura joinvilense. Os radialistas do “Chili Magazine” dizem que lutarão contra a alienação produzida nos meios de comunicação de Joinville e quiçá do país. Criticam as músicas mais tocadas e a falta de teatro e outras manifestações artísticas. Consideram-se vítimas de uma mentalidade grosseira, pouco refinada, que persiste na cidade. O pulo-do-gato da trupe radiofônica, que se classifica alternativa, é uma radionovela. O formato é um resgate interessante, mas a trama... uma vilã, por alguma razão, tenta alienar a cultura da cidade e blábláblá, o roteiro se esvai em uma verborragia caricata. Em “Chuville”, a cidade fictícia, a idéia toda chove no molhado.

800x600. ©2005 Agência Experimental de Jornalismo/Revi & Secord/Rede Bonja.