Corpos no asfalto e palavras-de-ordem. “Vem, vamos embora/ que esperar não é saber/ quem sabe faz a hora/ não espera acontecer”, cantam quase 100 pessoas dispostas lado a lado no cruzamento das ruas Alóis Finder com Rogério Pereira, no Bairro Aventureiro. A nostalgia da canção de Geraldo Vandré revela o óbvio: o sentimento de comunhão pela conquista de um único objetivo — o fim das mortes no cruzamento. Nem que para isso seja preciso fechar a rua em plena segunda-feira, 8 de novembro, das 15 às 18 horas.
E ali estão eles: jovens, adultos, velhos, crianças, mulheres, enfim, gente de todas as idades que não desanimam nem com a leve chuva que cai sobre seus ombros. “O que nos une é a luta pela nossa segurança e a de nossos filhos”, discursa a manifestante. “Chega de mortes, nós queremos a vida”, compartilha outro. Donas de casa agrupam-se em fileiras. Sentadas em caixas de verdura, elas contribuem para essa que acaba de virar uma questão de honra: conquistar um semáforo para aquele trecho.
Todos, absolutamente todos que ocupam essa estrada carregam bem vivas em sua memória as imagens das vítimas do trânsito violento. Uma mulher de 50 anos, esmagada nas rodas do caminhão-caçamba, um homem morto numa colisão, e a criança de apenas três anos, arremessada pelo pára-brisa, punida pela imprudência do pai que nem ao menos passou-lhe o cinto de segurança. Mortes violentas, mas completamente evitáveis, não fosse o esquecimento do poder público, verdadeiro culpado e agora diretamente responsabilizado pelos moradores. “A prefeitura precisa saber que o Parque Joinville existe”, grita outro homem com sotaque nordestino. Os manifestantes o exaltam já tomados pelo sentimento de revolta e indignação.
As horas passam, alguns moradores não compreendem a luta e questionam o bloqueio das vias. A chuva dá uma trégua e o coro novamente ganha força: “O povo/ unido/ jamais será vencido”. Jogar um caixão com as fotos dos mortos no gabinete do prefeito é a vontade de muitos, que são respaldados por outros tantos. Quatro acidentes por semana são registrados nesse cruzamento, três só na última sexta-feira, 5 de novembro, revela Fernandes dos Santos, 44 anos – é dele a voz que canta o hino revolucionário de Geraldo Vandré. “O prefeito é o verdadeiro culpado”, dispara uma voz no meio da multidão, que continua: “Ele põe a culpa na Lei de Responsabilidade Fiscal, como se nossas vidas não fossem mais importantes”.
Meses antes, uma comissão de moradores já procurara, sem sucesso, resolver o problema com a prefeitura. Diante da negativa, optaram pelo protesto: mostrar a força do povo e a sua reação frente ao descaso das autoridades. Algo que ocorreu nessa segunda e vai continuar acontecendo nas próximas, caso o poder público não atenda a reivindicação dos manifestantes. Sempre no segundo dia da semana, das 15 às 18 horas, no mesmo cruzamento, no mesmo bairro, com a maioria das mesmas pessoas.