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Matéria 0798, publicada em 21/09/2004.


Carta para Ádria e Zezé

Samuel Lima, jornalista e professor do Curso de Comunicação do Bom Jesus/Ielusc

 

 

Na roda do mundo,

Mãos dadas aos homens,

Lá vai o menino

Rodando e cantando

Cantigas que façam

O mundo mais manso,

Cantigas que façam

A vida mais doce

Cantigas que façam

Os homens mais crianças.

(Thiago de Mello)

 

 

         Já tinha lido na Internet o resultado da conquista de vocês, quando me sentei num café da cidade e encontrei um exemplar de um jornal do dia, deixado como naquele conto de Júlio Cortazar – um monte de papel e tinta que de novo virava jornal.

         Um sentimento sem nome me chega aos olhos ao ler os textos e observar as expressões da Ádria, na foto principal da cobertura dos Jogos Paraolímpicos de Atenas, neste 21 de setembro de 2004. Como se fosse a primavera, vocês invadiram os corações de milhões de brasileiros que acompanharam ao vivo a disputa. Ou seria mais preciso dizer: a competição cujo oponente não estava materializado nas outras atletas, mas numa prova de velocidade que vocês já tinham medalha antes de cruzar a linha de chegada: uma lição de vida, amor, paixão.

         Zezé diz que seu bronze nos 200m rasos é ouro, dignificando sua conquista e correndo para “dar uns beijinhos no seu amor” – o também atleta paraolímpico Júlio César Petto Souza. Ádria beija a medalha, e o brilho do seu olhar ofusca o ouro: é marca registrada daqueles seres humanos que trazem n’alma a “estranha mania de ter fé na vida”.

         Fecho o jornal, já acabou o café. À minha volta as pessoas passam ruminando sonhos e frustrações. As medalhas de vocês não têm brilho de ouro, nem bronze. São feitas de outro metal. Talvez uma parte do que vocês trazem no coração tenha sido flagrado na foto de Ádria beijando a medalha: feita de pura emoção, amor à vida; exemplos a serem seguidos de perto, de muito perto.

         Queria, com toda ternura e delicadeza, agradecer a vocês por isso! Vejo tanta gente se queixando da vida; quantas vezes só nos queixamos, sem tomar nenhuma atitude que indique a mais remota vontade de superar os obstáculos e dificuldades que a vida se nos impõe. Não existe nenhum obstáculo ao sonho humano, talvez nem a transcendência da morte física!

            É estranho, mas nem aquela genial conquista do ouro olímpico pela equipe de Bernardinho me trouxe tanta coisa boa ao peito. Um beijo imenso nos corações de vocês duas, meninas, que hoje renovaram em mim a convicção de que o ser humano – como precisamente escreveu o poeta Paulo Mendes Campos – é “um gesto que se faz, ou que não se faz”.

800x600. ©2005 Agência Experimental de Jornalismo/Revi & Secord/Rede Bonja.