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Matéria 0599, publicada em 06/04/2004.


:Fabrício Porto

Interesse pela política diminui entre estudantes

Fabrício Porto

Nada de urnas, nada de chapas, nada de eleição. Até o dia 16 de março, fim do prazo para inscrições, não havia qualquer chapa registrada para a cúpula do Diretório Acadêmico de Comunicação Social (Dacs) do Ielusc. A julgar pela apatia dos alunos diante desse quadro, o movimento estudantil passa por uma crise de identidade.“Eu esperava pelo menos uma chapa, pois tinha um pessoal que parecia interessado”, lamenta Juliano Pfutzenreuter Nunes, integrante da última diretoria do Diretório Acadêmico. O Dacs fica de portas fechadas até que um novo edital, o terceiro em cinco meses, seja lançado.

Roberto Ravali, ex-militante do movimento estudantil da década de 80 e acadêmico da 3ª fase de Jornalismo, considera essa apatia um reflexo de toda a desmobilização acadêmica registrada no Brasil. O movimento que originou a União Nacional dos Estudantes (Une) em 11 de agosto 1937 carece, segundo ele, de “uma ampla mobilização e um constante trabalho de conscientização dos estudantes”.

Ravali relembra a visita do presidente João Figueiredo a Florianópolis em 30 de novembro de 1979. Os estudantes foram às ruas e juntaram-se à população num movimento contra o autoritarismo do sistema vigente na época. A Novembrada, como o protesto foi chamado, caracterizou-se pelo confronto dos manifestantes com a polícia da ditadura militar. “Um país que apresenta profundas desigualdades sociais, como o Brasil, necessita sim de uma revolução. Talvez não com a luta armada, mas através da organização da sociedade”, avalia o estudante. Ravali destaca o desconhecimento dos acadêmicos sobre seus direitos, como ponto fundamental para o comportamento tímido do movimento estudantil brasileiro.

Jornalista e ex-atuante do movimento, Gastão Cassel questiona a nostálgica revolução armada da época ditatorial, mas admite já ter sonhado com essa revolução. Entretanto, hoje pensa em uma revolução diferente, com base na organização de classes, contextualizando-a com a mudança da história recente. “As coisas estão extremamente difusas. Ninguém tem esta clareza para saber contra quem lutar. Antes, era mais fácil, a gente enxergava o alvo”, desabafa Gastão.

Dentre todas as características dos estudantes revolucionários dos anos 70, aparentemente teria sobrado apenas a camiseta vermelha do Che Guevara. Diante de uma história que rendeu 60 anos de luta, o movimento sofre hoje com a apatia dos estudantes, lamenta a psicóloga e professora Márcia Amaral.

Como Ravali, Márcia questiona a falta de consciência do estudante em relação ao espaço legitimado pelo Dacs. Ela acentua a desmobilização dos acadêmicos, enfatizando o desconhecimento sobre a consciência de um espaço que lhes é de direito. Esse direito conquistado por estudantes, nas décadas de 60, 70 e 80, faz parte da história, assim como os congressos clandestinos realizados no ano de 1967. A busca da liberdade de expressão e a mobilização contra a ditadura resultaram em mortes, entre as quais a do estudante Edson Luis Lima Sonto, assassinado no restaurante “Calabouço” em março de 1968.

Valdete Niehues, professora de Sociologia, aponta o desinteresse dos estudantes pelas causas sociais como ponto fundamental para a desmobilização acadêmica. Em sua opinião, a expressão “movimento estudantil” parece equivocada e necessita de um novo conceito. “A política neoliberal substituiu o sonho pelo consumismo, o coletivo pelo individualismo, a utopia pelo imediatismo”, aponta a professora. Ela questiona a função do diretório acadêmico, destacando a preocupação do estudante em conseguir o certificado apenas para fins individuais, fazendo com que os alunos não ultrapassem as barreiras acadêmicas para a melhoria da comunidade.

O individualismo e a não-solidariedade entre classes enfraquecem cada vez mais esses movimentos, esclarece o jornalista Gastão. Para ele, os diretórios acadêmicos deveriam assumir uma postura contestatória e não apenas interferir no contexto das universidades, mas também no campo extra-acadêmico. A impossibilidade de ultrapassar os muros que o cercam, leva o estudante, de acordo com Gastão, a se comportar como um cidadão com o foco direcionado para si.


 

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